quinta-feira, 7 de julho de 2011

A PAZ ESSENCIAL
Tam Hao Van

Embora seja fundamental, a paz precisa de elementos para existir e se manter. Não falo da paz externa, a paz do descanso e da tranqüilidade diária; falo da paz essencial, sem a qual nossas vidas jamais serão plenas, e sem a qual a paz externa, como dolorosamente percebemos todos os dias, será sempre um sonho aparentemente inalcançável.

No âmago dos ensinamentos de Buda, no coração fundamental de tudo o que ele procurou demonstrar, encontramos os dois elementos sobre os quais a Felicidade se sustenta: a Liberdade e a Paz Interior. Buda fala do despertar, nos aponta para o caminho que nos conduzirá para a redescoberta de nós mesmos; ao longo deste caminho, não sem esforço e profunda concentração, estaremos nos despojando de medos e ódios, apegos e insatisfações, estaremos enfim nos libertando de nós mesmos. Esta espécie de morte e renascimento às vezes nos parece assustadora, ou então tolamente romântica, mas não é. Esta transformação é o que há de mais valioso nas experiências humanas, aquilo que faz de um simples ser humano esquecido de si mesmo um Buda desperto para o valor essencial de todas as coisas.

A Paz essencial pode e deve ser praticada. E para a praticarmos, devemos estar prontos para nos libertar de nós mesmos, deixando assim nossos espíritos abertos para a realidade das coisas. Para que esta paz seja criada, precisamos igualmente saber praticá-la em nossas mentes e atitudes, cultivando assim a semente da compaixão, tolerância e indiferenciação. Paz, portanto, não deve ser encarada como um ato político, social ou emocional; ela deve ser percebida com um ato vital, pleno, que se sustenta com a percepção clara do quanto às atitudes internas de impaciência, egoísmo e indiferença nos levam invariavelmente para atos cruéis e violentos, sejam eles políticos, sociais ou emocionais. Se em nossas próprias vidas particulares, quando tomamos alguma atitude de intolerância, frieza ou agressividade — às vezes consideradas tão banais e corriqueiras — contra nossos pais, irmãos ou irmãs, maridos ou esposas, filhos ou filhas, ou contra amigos e pessoas que trabalham conosco ou para nós e até mesmo contra as outras criaturas que nos cercam, muitas vezes imaginamos que essas atitudes não têm nada a ver com as guerras, crimes, assassinatos e crueldades do mundo, isso com certeza será um terrível engano; pois justamente nos atos mais comuns a origem do sofrimento de todos os seres está arraigada. Tudo está interligado, e todo ato inconsciente e ignorante criará uma conseqüência em outro lugar; todas as coisas são interdependentes, todas as mentes e corações vivem sob a força da interconexão do cosmos. Isso não é apenas retórica poética, é na verdade um fato universal, um Dharma, uma grande sabedoria.Como Buda afirmou, sempre existe uma saída, sempre há um caminho. A confiança na Paz como algo possível é a base sobre a qual a Paz Essencial irá nascer. Não imagino soluções coletivas para o surgimento da Felicidade dos seres, mas confio plenamente na solução individual para que essa felicidade real surja nos corações de todos, para que saibamos cada vez mais olhar as coisas com olhos de igualdade, com o espírito de liberdade.

Para nos livrarmos de nossas frustrações, neuroses (mesmo as mais terrivelmente profundas), medos e ódios, faz-se necessário encontrarmos a liberdade de nós mesmos. Assim, convido a todos para um esforço que está muito além de ser apenas budista, mas que será sempre um esforço digno das mentes sensatas e alertas, independentemente dos caminhos: que todos nós busquemos a paz essencial, cultivando deliberadamente — mesmo que isso pareça tão difícil — os atos de paciência e compreensão.

Quando você estiver pronto para agir com raiva e egoísmo, pare! Durante alguns segundos observe o que você está fazendo, compreenda que existe sempre outra saída, sempre há um modo de superar o ódio e agir com cuidado. Quando você estiver pronto para agir com indiferença ou preconceito, pare! Tente ver o quanto sua atitude é injusta e cruel,
compreenda que existe sempre outra saída, sempre há um modo de superar o medo do outro e agir com atenção e respeito.

Quando você estiver pronto para agir com arrogância e vaidade, pare! Tente ver o quanto sua atitude é imatura e vazia, compreenda que existe sempre outra saída, sempre há um modo de superar o orgulho e percebe o valor correto da humildade. A Paz Essencial também é como uma semente, e pode ser regada com a água da prática atenta e consciente.
É uma semente que cura e alivia os espíritos, e sobrevive mesmo nos corações mais esquecidos de si mesmos.

Pratique a paz.

Nenhum comentário:

Postar um comentário